Os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 tiveram uma série de prenúncios. Os primeiros acordes da sinfonia golpista foram feitos em 30 de outubro de 2022, o domingo do segundo turno da eleição que consolidou a volta de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência da República.
O dia de votação foi marcado por operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) por suspostas irregularidades em transporte público de eleitores. As ações se concentraram principalmente na região Nordeste. Tal situação levou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), determinar que o então diretor da corporação, Silvinei Vasques, interrompesse as ações “imediatamente”.
Em seguida, inconformados com o resultado da disputa, caminhoneiros e outros apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) bloquearam estradas em todo o país — movimento que persistiu ao longo de alguns dias. Em paralelo a isso, diversos grupos acamparam em frente a quartéis do Exército na tentativa de comover os militares em favor de suas demandas.
Em 12 de dezembro daquele ano, houve a diplomação de Lula como novo presidente da República. Enquanto a cerimônia acontecia no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), bolsonaristas protestavam na região central de Brasília, já com cenas de depredações — inclusive, do prédio da Polícia Federal.
Já na véspera do Natal, houve uma tentativa de explosão de um caminhão-tanque nos arredores do Aeroporto de Brasília — os três envolvidos no caso já foram condenados pela Justiça do Distrito Federal.
A Itatiaia lembra, abaixo, os cinco episódios que esquentaram as turbinas dos atos antidemocráticos:
Operações da PRF. Durante o dia de votação do segundo turno, a PRF realizou uma série de operações para supostamente coibir transporte clandestino de eleitores. Foram mais de 500 ações, espalhadas principalmente pela região Nordeste do país.
Essa movimentação fez com o que ministro Alexandre de Moraes determinasse que o então diretor da corporação, Silvinei Vasques, interrompesse “imediatamente” as operações. O presidente do TSE estabeleceu que, em caso de descumprimento, Silvinei poderia ser multado em R$ 100 mil, afastado das funções e até preso por desobediência e crime eleitoral.
Em agosto de 2023, ele foi preso pela Polícia Federal (PF), pelas ordens de operação. Até o momento, ele segue preso.
Bloqueios de estradas. Após o anúncio da vitória de Lula, uma série de bloqueios aconteceu entre 30 de outubro e 4 de novembro de 2022. Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), foram ao menos 975 pontos de interdição em todo o país.
O caso precisou, inclusive, da intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF). A pedido da Confederação Nacional do Transporte (CNT), o ministro Alexandre de Moraes determinou que a PRF e as Polícias Militares estaduais atuassem, dentro de suas atribuições, para desobstruir imediatamente as rodovias.
O ministro determinou a aplicação de multas de R$ 100 mil aos donos dos caminhões usados nos bloqueios. Em paralelo a isso, a PRF aplicou 6.200 multas comuns do Código de Trânsito.
O ex-presidente Bolsonaro se manifestou três dias após o início dos bloqueios. “Brasileiros que estão protestando em todo Brasil, sei que estão chateados, estão tristes. Eu também esperava outra coisa e eu também estou tão chateado e tão triste quanto vocês. Mas, precisamos colocar a cabeça no lugar. Os protestos, as manifestações são muito bem-vindas e fazem parte do jogo democrático. E ao longo dos anos muito disso foi feito pelo Brasil, pela Esplanada, pela Paulista, Copacabana, mas tem algo que não é legal. O fechamento de rodovias pelo Brasil prejudica o direito de ir e vir das pessoas”, afirmou.
Como resultado, 49 pessoas foram presas pelos bloqueios.
Quartéis. Em paralelo aos bloqueios das estradas, grupos bolsonaristas também se mobilizaram em acampamentos em frente a quartéis do Exército em todo o país. Em Brasília, eles se concentraram em frente ao Quartel-General por quase três meses.
Por lá, os pedidos de intervenção das Forças Armadas para anular a eleição e impedir a posse de Lula eram a rotina. A concentração, mesmo com pedidos inconstitucionais, não foi impedida até 9 de janeiro, quando foi desmobilizada após os atos do ano anterior.
De acordo com as autoridades policiais, o “QG” tem ligação direta aos dois atos violentos pré-8 de janeiro: a noite de vandalismos em 12 de dezembro e a tentativa de explosão de um caminhão próximo ao Aeroporto de Brasília.
12 de dezembro. O clima antidemocrático esquentou no dia da diplomação de Lula como vencedor da eleição. O primeiro grande ato de vandalismo fez Brasília parar. Oito veículos foram depredados e incendiados. A sede da Polícia Federal quase foi invadida. Uma delegacia de polícia foi atacada. Apesar disso, ninguém foi preso.
O vandalismo começou em frente à Polícia Federal por volta das 19h30. O movimento começou após José Acácio Tserere Xavante, apoiador de Bolsonaro, ser preso por determinação do STF atendendo a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). O indígena era investigado por participação em outros atos antidemocráticos.
Depois da PF, os manifestantes seguiram pela Asa Norte de Brasília. Um ônibus foi incendiado e botijões de gás espalhados por algumas ruas da região.
Parte do grupo seguiu pela Asa Norte, onde realizou novos atos de vandalismo. Pelo menos um ônibus foi incendiado; botijões de gás foram espalhados em ruas da cidade. A PM foi acionada. Os militares usaram bombas de gás e balas de borracha em confronto com os manifestantes. Naquele dia, Lula estava hospedado em um hotel próximo.
Explosivo. A manhã da véspera do Natal de 2022 foi marcada pela tentativa de explosão de um caminhão próximo ao Aeroporto de Brasília. A PM foi acionada pelo motorista do veículo que percebeu um artefato estranho instalado no veículo. O esquadrão de bombas do Batalhão de Operações Especiais (Bope) identificou que o artefato se tratava de um explosivo, que foi removido e detonado em um local seguro.
Durante a noite, o empresário George Washington de Oliveira Sousa foi preso pela montagem do explosivo. Frequentador do acampamento bolsonarista em frente ao QG do Exército, ele foi indiciado por terrorismo. A explosão seria um caminho para iniciar o “caos”, conforme depoimento dele. O objetivo seria a decretação de um estado de sítio no país.
Além de George, outros dois homens foram presos e condenados pela tentativa de atentado: Wellington Macedo de Souza e Alan Diego dos Santos Rodrigues. O trio está preso na Penitenciária da Papuda, em Brasília.
Em maio de 2023, George foi condenado a nove anos e quatro meses de prisão e Alan a cinco anos e quatro meses. Em agosto, Wellington Macedo de Souza foi condenado a seis anos de prisão em regime fechado. Em novembro, a Advocacia-Geral da União (AGU) cobrou R$ 15 milhões dos acusados por risco à vida e ao patrimônio de terceiros, além da tentativa de causar comoção social para justificar a decretação da intervenção militar.